ainda cerrada
a luz da madrugada
ainda coada
entra
sem dizer nada.
e de meus olhos dormidos
um claro despertar
do novo dia a chegar.
para trás
no meu lugar.
"Cada segredo da alma de um escritor, cada experiência de sua vida, cada qualidade de sua mente está escrito em suas obras." - Virgínia Woolf.
bebo todos os esquecimentos
nos ventos impiedosos
do fim da tarde.
já nada sei do que esqueci
no sol ímpio da mortalha.
sobre a pele
estende-se a memória
adormecida ou em falha.
não consigo apreender
a sua vontade de esquecer.
quero recordar
quando o sino toca e o seu eco ecoa
na planície da vida.
lembra-me as horas findas
ou outras que foram minhas.
dos pássaros em mim
como se a brisa
rasgasse as ondas
e ao meu corpo chegasse
esse aroma
maresia em voo sem fim
bailado de alma
num chão de mar.
e seria gaivota no teu olhar.
Não é por ti nem por mim
Não é por uma profunda paixão
Não é por te dar a mão
É por este caminho sem fim
Que para trás ficou
Sem sabermos onde começou.
Na mais empoeirada "picada"
de cajueiros e acácias ladeada
desliza a mota
dentro de sulcos e perícia.
- Corro para os teus braços, mãe!
Desprendem-se das galáxias
nesta estrada tão longa
as pétalas que o teu amor tem.
Minha amiga se perdeu
onde teria posto a pata?
Ai, agora, que faço eu
Ai, doida da minha gata.
Não sabe ler ou escrever
E muito menos falar
Se alguém a voltar a ver
Que lhe diga p'ra miar
Ai, pobre da minha gata
Que passa a noite ao luar
Perdida em amores de lata
Se ninguém a encontrar.
Um só dia bastante seria
se esse fosse o único dia
o dia em que te conhecia.
Seria o dia que marcaria
a vida vivida desse dia
na vida que então teria.
Dessa vida outra vida nasceria
tão diferente tão pungente
tão cheia onde jamais morreria.
Eterno sonho que alcança
o azul celeste dos anjos
numa constante mudança.
E se porventura a criança
fosse sempre esse dia
então não haveria noite
a matar a crua esperança.
*frase "roubada"
bolsos vazios sem vintém
como um filho
que não reconhece a mãe.
mãos estendidas
a iludirem promessas que não tem.
nunca teve intenção de pedir
muito menos a desgraça de cair
abandonado como um cão.
muita gente sem o ver
já ninguém repara
já ninguém lhe estende a mão.
tornou-se transparente.
.........
AQUI:"Portugal está mais pobre. Nas famílias, nas empresas, na riqueza que é criada a nível nacional. A pobreza não tem idade, prolifera tanto entre os mais jovens como entre os mais velhos e vê-se cada vez mais nas ruas. Basta voltar a percorrer o centro histórico da capital para reparar como essa dura realidade está presente. Agrava-se a miséria e a situação dos sem-abrigo. Não podemos ficar indiferentes aos números revelados ontem - Dia Internacional da Erradicação da Pobreza e dos Sem-Abrigo - pela Santa Casa da Misericórdia de Lisboa. No último ano, 212 pessoas morreram nas ruas da capital sem que ninguém desse conta, sem que qualquer familiar reclamasse o corpo. Que país é este onde isto acontece? Que democracia estamos a construir e assente em que valores e em que modelo de desenvolvimento?"
de ti
levarei o sol das manhãs
e o canto da tua voz.
levarei as lágrimas caídas
em tardes desprovidas.
e, se não bastasse
levarei o olhar do meu regresso
mesmo se a noite se calasse.
.....
medra a noite
escura
com a mais bela
das estrelas
pura
e o meu céu em
brandura.
bem perto
à minha beira
essa estrela
na longa noite
companheira.
luz intensa
quase cegueira
fonte e desejo
na pele
ternura
quase frescura.
Hoje faço anos
I.
à boca seca do cântaro
o destino aberto
ao encontro.
e a fonte enamorada
canta o seu canto
encantada
por se saber desejada.
II.
sopra poesia nas folhas
verdes
das árvores.
mariposas palavras
ao vento
arrastadas
a sonharem dispersas
o encantamento dum encontro.
Somos a rosa-dos-ventos
desenhada num papel
mapa dos pensamentos
emoções de cardos e mel.
Somos a rosa-dos-ventos
sem divisão das nações
cada um de nós em momentos
nas desenfreadas paixões.
Nada mais fica de fora
desta primavera em flor
só nos resta esta hora
para escrever este amor.
Encontramo-nos os dois
numa última fronteira
o dia e a noite inteira
no alto-mar navegado
na rabisco do poema
com marés no pensamento
como se fosse a vez primeira.